“Apaixonar-se é uma loucura. É como uma forma de insanidade socialmente aceitável.”
Vou precisar pegar uma frase
emprestada de um dos personagens de um dos filmes mais lindos que eu já vi,
para tentar explicar como eu me sinto agora. Não conseguirei parafrasear, pois
não me lembro exatamente das palavras de Theodore, mas o que eu quero dizer é
mais ou menos isso: “Existem dias em que eu sou minha escritora favorita.”.
Hoje, não é um deles. Aliás, há muito que não venho sendo. Eu estou procurando
palavras para externalizar o que venho sentindo, mas elas se perdem dentro de
mim e não fazem o menor sentido.
O filme citado acima é Ela,
uma obra espetacular de Spike Jonze, com Joaquin
Phoenix e a voz inconfundível de Scarlett Johansson, como protagonistas. Ela é uma história de amor que faz a gente
repensar nossas próprias histórias. Assisti ontem, mas algumas (ou todas?) cenas ainda se misturam dentro de mim e andam em círculos por minha cabeça.
Os sentimentos, que pairavam nas cenas do
filme, remeteram-me instantaneamente a uma
frase que disse uma vez a um rapaz, que nunca tinha visto na vida, após
menos de 30 minutos de conversa ao telefone: “Eu gosto de você exatamente do
jeito que você é. Eu gostaria de você mesmo se você não tivesse um braço, uma
perna ou estivesse impossibilitado de andar. Algo em você me lembra o que é real
em mim, no mundo, na vida”.
Eu falei "gosto", para não parecer tão
maluca, mas a verdade é que a palavra certa seria "amo". Em um mundo
em que tudo é passatempo e passageiro, eu não queria correr o risco de
assustá-lo ao falar de amor como se fácil. Pior, como se fosse possível. Mas
foi. E é. Entre tantas idas e vindas, tragédias e milagres cotidianos, eu
descobri de uma forma simples e direta que só o amor é real.
Ele conheceu minha dor e isso não o assustou. Foi
uma espécie de reflexo, reconhecimento. Havia lágrimas implícitas. Até na dor,
somos iguais.
Em alguns momentos, a impressão era de que o espaço
físico que nos rodeava e os quilômetros que nos separavam desintegravam-se. Em
instantes, éramos apenas palavras intensas, sussurros, saliva, gemidos e
batidas aceleradas do coração. Éramos um só, coabitando em um espaço ausente de
tempo ou matéria.
E teria sido amor à primeira vista, caso
estivéssemos face a face. Mas não estávamos. Então, foi melhor, mais puro,
inocente, sincero.
E você deve estar se perguntando o que todas essas
baboseiras melosas e sentimentais têm a ver com o filme. Eu respondo: Tudo. E
explico:
Eu sou o beijo imaginário que Samantha dá na testa
de Theodore. Eu sou as cartas de amor escritas à voz. Eu sou a euforia e encantamento
de Samantha ao descobrir o mundo e seus gemidos incontidos ao desvendar o
prazer. Eu sou as fotografias em forma de notas de piano. Eu sou as
tentativas frustradas de Amy. Eu sou os transtornos obsessivos compulsivos
de Charles. Eu sou a prisão entre paredes virtuais. Eu sou a paixão de Theodore
pelo intangível. Eu sou o perfeccionismo de Catherine. Eu sou todas as dores de
um amor que acabou, mas que ainda pede para acontecer. E o meu presente é apenas uma versão do futuro bege
onde Ela é ambientado. E o rapaz? O rapaz é a
voz de Samantha materializada diante de mim, insistente, andando em círculos e
sem pressa para ir embora.
Ela é
uma prova cinematográfica de que há sempre algo mais forte e insistente que
pulsa, mostrando-nos que é sempre possível transformar a solidão em poesia
futurista. E, depois de tantos dias, eu ainda o amo, inclusive cada
partícula que não pude ver ou tocar, cada pedaço oculto que sangra e dói. Tudo
o que não vivemos ainda é o retrato mais lindo que guardo.
- No olhar amarelado dele, vi uma estrada. Nós seguimos. E no lugar onde
deveria haver um final, tinha apenas um início.