quinta-feira, 12 de junho de 2014

Para o garoto com o fiote de urso

Eu vejo o rombo da sua ausência, quase ao ponto de poder tocá-la. Eu sentia sua falta antes mesmo de você se fazer presente. E isso parece um contrassenso, quase tanto quanto você dizer que me ama todos os dias. Eu fico confusa, perdida e choro. Tudo isso porque passei uma vida inteira colecionando cicatrizes e hematomas e tenho medo que seja tarde para o amor me salvar. Sinto medo como nunca, amor.

Naquela época, em meados de 2005, meu coração não sabia perdoar sua ausência, mesmo sem saber se você realmente existia. Na parede da memória, esse é o quadro que dói mais. Era complicado e doído viver sem te encontrar nas calçadas da Escrivão Azevedo, na poluição visual, no espaço vago entre comprar pão na padaria e as noites de prisão nos muros virtuais. Você estava lá o tempo todo, mas eu não conseguia ver. Nem você me via.

Eu fui programada com um compartimento na minha mente que sempre te mantém no centro de saudades atemporais. Em determinados momentos do meu passado, a única coisa que eu gostaria era poder ter retirado você de lá. Para a minha impaciência juvenil, não parecia justo que fôssemos somente um possível futuro.

De repente, todo passo errado e toda despedida mal calculada ocasionou em um adeus que me levou até você. E, de alguma forma, compactamos e nos unimos.


Hoje, vivemos em um mundo só nosso, em que podemos entrar em um pet shop e comprar um filhote de urso, deitar em uma rua movimentada como se fosse uma cama de casal, cantar músicas imprevisíveis e, sem hesitação, sonhar de olhos abertos e beijar de olhos fechados. 


23.05.2014 (um mês e um dia)

Sobre o improvável

Foi pelo canto do olho esquerdo que eu comecei chorar na segunda vez em que nos abraçamos. Eram lágrimas para as coisas que estavam por vir e que eu não sabia mais que existiam (se é que haviam existido algum dia).

Aquele braço nas minhas costas e o peito contraindo o meu abriram instantaneamente caminhos e preencheram lacunas. A sua pupila atenta e dilatada meio que denunciava que os meus mecanismos de defesa, usados sempre para repelir tudo e todos, seriam completamente ineficazes. Eu não desconfiava que alguém seria imune ao limbo triste que existe no jeito que aprendi a amar e a repelir o amor.

Você respondeu tacitamente todas as minhas perguntas. É fato que a sua chegada trouxe tantos outros questionamentos. A diferença é que agora eu não me importo tanto com as respostas, prefiro usar o meu tempo com você.

De todos os improváveis da minha vida, te (re)conhecer e (re)encontrar foi um dos mais bonitos. 

sábado, 3 de maio de 2014

Something

Você pergunta até quando irão usar esmaltes vermelhos descascando. Eu seguro as suas mãos com dedos quase sem unhas, te puxo para perto de mim e cantarolo perto do seu ouvido: "You stick around now it may show". Você responde sério: "I don't know, I don't know", mas não resiste e acaba sorrindo, porque meu inglês é mais errado que passado de crente e a minha voz, irritantemente feia. Mas, ainda assim, me vale uma vida um sorriso teu roubado, como se fosse um segredo que contou só para mim.


- Quantos segredos por trás de teus sorrisos de dentes tortos, eu já guardo?






"Somewhere, in her smile, she knows
That I don't need no other lover

Something in her style that shows me"